quinta-feira, 27 de setembro de 2018

O QUE NÃO É CONSTELAÇÃO FAMILIAR



    Pessoal, estive resistente em escrever sobre esse tema, mas acho que estamos num momento onde há uma necessidade de alguns esclarecimentos.

    A constelação familiar vem ganhando força, sendo conhecida por muitos, e isso me deixa muito feliz. Saber que um processo de cura tão bonito e tão profundo está crescendo é realmente empolgante. Só que nem tudo são flores, com o crescimento da busca pela abordagem, cresce também a oferta de trabalhos que carregam o nome mas não a essência do que é constelação familiar.

    A ideia deste breve artigo é ajudar as pessoas, principalmente aquelas que nunca tiveram acesso à constelação familiar, ou seja, não participaram de um seminário, palestra, grupo, curso, ou que nunca leram um livro do Bert Hellinger (criador da constelação), ou nunca assistiram nenhum vídeo do próprio Bert (ou de seus professores) demonstrando como é a constelação. Trocando em miúdos, nunca tiveram contato com a fonte.

Vamos lá!

CURA RÁPIDA

    Muitas pessoas têm interesse numa cura rápida e transferem o resultado para algo externo, por exemplo, uma constelação familiar. E esquecem que aqui se trata de um processo de crescimento. Portanto, quando se vende à imagem de que a constelação é uma cura rápida, milagrosa, quase mágica, abra bem seus olhos.

    Você acha realmente que algo de fora, um terapeuta, um medicamento, uma mágica irá simplesmente mudar sua realidade e te fazer feliz? Se a resposta for sim, então, muito provavelmente você cairá em mãos duvidosas. Porém, se você estiver disposto a dar passos rumo a um crescimento pessoal duradouro, sabendo que existe a sua responsabilidade nisso, e que a constelação, como qualquer outro processo será apenas um estimulante para seu caminhar, então, certamente você encontrará profissionais responsáveis.

    Já me ligaram perguntando em quantas sessões a família se cura a tal ponto de todos voltarem a se falar. Outros já me perguntaram se uma constelação é suficiente para curar um transtorno bipolar do filho. Eu já vi muitas pessoas se transformarem realmente, após uma constelação, mas isso está totalmente relacionado à disposição interna da pessoa em encarar seus fantasmas, curar as feridas, e agora, numa postura mais madura, ressignificar sua história. É outro movimento. Escrevi detalhadamente sobre isso neste link:  "constelação familiar a terapia milagrosa"

MANIFESTAÇÃO ESPIRITUAL

    A constelação trabalha com campos de informação. Sheldrake, biólogo, fala sobre campos mórficos e morfogenéticos, que contém todas as informações da espécie e seus subgrupos (como a família, por exemplo). E é esse campo que a constelação mostra: um campo de informações da família, ou do sistema que o cliente está constelando. Nada além disso faz parte da constelação. Não tem espírito que “desce”, nem santo ou anjo que “aparece”, os mortos não dão as caras (apesar de haver sim representantes para eles). Ou seja, manifestações espirituais, não fazem parte da constelação. Isso é crença religiosa. E se você perceber que algum trabalho está seguindo por esse caminho, acione suas anteninhas. Pode ser que o trabalho que você está participando seja muito transformador, mas se tem qualquer comunicação com o “além” não se trata de constelação, e sim outra coisa.

    Uma vez participei de um trabalho que havia muita música, as pessoas cantavam e rezavam. O cliente, que iria constelar sentou-se na frente do terapeuta e ali começou um grande interrogatório. O que me chamou atenção nesse trabalho específico foi o que o terapeuta não seguia às Ordens do Amor (Leis Sistêmicas identificadas por Bert Hellinger, que são a base filosófica do trabalho, mais para frente compartilho um texto sobre isso). Aí pensei:  como pode um trabalho de constelação não respeitar a base da constelação? Fiquei preocupada. Nada de representantes, só rezo e cantoria. Havia umas 20 pessoas e mais da metade não conhecia constelação. Saíram dali achando que era isso. Foi a primeira vez que me preocupei com terminologias.

    Já vi trabalhos onde linhas mais religiosas se misturaram ao trabalho, como umbanda, orações antes das constelações, rituais xamânicos, entre outros. Eu respeito muito o credo de cada um, porém quando se mistura isso à constelação, já não podemos mais chamar de constelação. O trabalho pode ser muito curador, mas é uma mistura, portanto, acredito que um novo nome deveria ser dado.

    Eu sempre me questiono o motivo das pessoas não darem novos nomes ao que se inventa. Seria tão legal, se as pessoas, por exemplo, falassem: Cura da Árvore Genealógica através de Xamãs, ou através de Espíritos Afros, ou algo assim. É como falar “queijo vegano”, sendo que na verdade é um alimento à base se soja (que é delicioso, por sinal, mas sempre percebo que vou em busca do “queijo”). Por mais que o sabor e a textura lembrem a de um queijo, não é queijo. Queijo é feito de leite!  Vamos dar nomes novos ao que é novo!

    Ainda sobre o tema acima, é importante frisar, que nós carregamos as nossas crenças religiosas. E às vezes isso é tão forte, que pode sim aparecer numa constelação. Por exemplo, numa família, onde muitos fizeram parte da igreja, foram seminaristas, essa informação pode surgir, e ser colocado um representante para tal, porém o próprio “santo” não vai surgir e falar com você. É apenas uma informação que já existe na sua família.

DESCOBRI NUMA CONSTELAÇÃO QUE TENHO IRMÃOS

    Atendi muitas pessoas que já constelaram. E ao indagar se a pessoa tem irmãos, ela me responde que sim, que “descobriu” através de uma constelação que tem X irmãos.

Bom, vamos lá!

    Temos acesso a um campo de informação. Esse campo de informação é oculto, inconsciente, mas que contém todas as informações a respeito de seu grupo/espécie. E se sua mãe teve um aborto, essa informação ficará armazenada nesse campo, como num banco de dados. Às vezes, durante uma constelação, o constelador percebe que tem informações faltantes e isso se comprova, ao adicionar na constelação, um representante que se posiciona como um feto, ou uma pessoa falecida (por exemplo, deitado no chão). Quando esse tipo de informação surge durante uma constelação, é muito provável que houve ali uma morte que não foi vivenciado o seu luto, ou que aquela pessoa foi esquecida (falarei sobre isso detalhadamente noutro artigo). Por isso, os mortos são tão “presentes” através das representações. Precisamos viver luto, e luto é ainda tabu.

    Bom, voltando à questão. Não há como ter certeza que aquele representante é um irmão, um filho, um neto. É uma informação forte, presente, mas empírica. Só pode ser comprovado e dito como real, se sua mãe disser à você que ela abortou ou que perdeu um filho. Não podemos dizer que a constelação revelou com precisão que era um irmão. Poderia ser um filho de sua avó.

    De qualquer forma, por favor, se você tiver uma experiência como essa, não vá perguntar a sua mãe se é verdade. Se ela quisesse compartilhar essa informação com você já o teria feito. Respeite o segredo dela. O que você pode fazer? Guardar essa informação, de que existiu um feto, ou alguém que não pôde viver em sua família, e que agora você dá um lugar no seu coração à essa pessoa, mesmo que você não tenha certeza de quem ela é.

    Em alguns livros traduzidos do Bert Hellinger, durante a constelação, ele afirma ser um irmão, um filho. Mas estamos falando do criador do método, certo? Então, particularmente, prefiro ter cuidado com afirmações tão precisas. Prefiro dizer: “é alguém que quer ter um lugar em sua família, talvez um irmão, mas não temos como ter certeza”. Já é suficiente para a liberação e a cura começarem a ocorrer.

NÃO HÁ RITUAIS

    Uma vez em um curso que no qual eu participava como aluna, em um grupo ao meu lado, durante as práticas, um colega pegou um spray com aromas e começou a borrifar nos representantes. Quando a professora se aproximou e questionou o que estava sendo feito ali, os alunos disseram que havia muita energia negativa na constelação e que o spray era de limpeza. Imaginem a bronca que eles levaram.

    Quero deixar claro que respeito todas as terapias possíveis, e tudo que foi criado para melhorar a qualidade de vida é válido. O que quero frisar nesse artigo é que precisamos cuidar com as misturas feitas. Se o constelador quer usar um incenso, colocar uma música, trabalhar com cores, com espíritos, enfim, colocar sua crença ou incorporar outras técnicas terapêuticas no processo da constelação, isso é de responsabilidade do profissional. O que eu acho importante é que nesses casos, seja esclarecido, principalmente para pessoas novas, que esse “adicional” é por conta do próprio terapeuta, e que não faz parte do trabalho do Bert Hellinger.


    Bom, nesse ponto, acho importante relembrar o que é então a constelação familiar, no sentido mais prático, como método. E para isso, compartilho alguns trechos do próprio criador em seu livro A Fonte não Precisa Perguntar Pelo Caminho.

O que é constelação familiar?

    É um trabalho muito profundo, que ocorre normalmente em grupo. “No decorrer das constelações o cliente escolhe, dentre os participantes, representantes para os membros de sua família que são importantes, portanto, o pai, a mãe, os irmãos, etc. Então, concentrado e a partir de seu sentimento interno posiciona-os, uns em relação aos outros”. 

    “Durante o processo o constelador faz perguntas básicas: se alguém é casado, tem filhos, se houve algum parceiro antigo. Ou se morreu alguma criança. Ou seja, fatos importantes. Informações breves e curtas. Não há necessidade de saber se o pai do bebê é bom ou mau, se é dominante ou submisso. O que conta são fatos externos.”

    “Os representantes que forem escolhidos colocam-se à disposição. (ou seja, livre de intenções, pensamentos, desejos, normalmente de olhos abertos, braços relaxados). Tão logo os representantes estejam na constelação, sentem como as pessoas que eles representam. Às vezes até mesmo sentem sintomas físicos. Portanto, é necessária uma certa coragem para entregar-se a isso.  Daquilo que se mostra, ou que vem à luz, resulta como um passo à uma solução dentro do que o cliente busca.”

    “Através de uma constelação familiar origina-se um campo de força. Quem entra nesse campo de força, como representante de um membro da família, comporta-se como alguém que pertence a esse campo de força. Provavelmente a família é um campo de força. Rupert Sheldrake fala de campos morfogenéticos. Isso quer dizer que nesse campo de força continuam agindo certos padrões que estavam ali, como compulsões, vícios, coisas que se repetem. Por isso, quando os representantes penetram nesse campo, sentem como as pessoas reais”.

    “As constelações são na verdade algo simples. Escolhemos representantes para as pessoas de referências importantes e as colocamos umas em relação às outras. De repente, aparece algo oculto, que vem à luz através da constelação, por exemplo, alguém que foi excluído. Após a constelação, é importante que o cliente tenha um tempo para si, para que tudo possa ser acomodado dentro de sua alma. Não se analisa nem se interpreta uma constelação.”

    Para finalizar, acredito, que cada pessoa está no lugar, hora e com as pessoas certas, vivendo as experiências certas para si. Também acredito que tudo serve ao nosso aprendizado. Nosso ser interno, nossa consciência, intuição, ou o nome que quiser dar a isso, nos direciona sempre àquilo que é importante ao nosso crescimento. Assim sendo, só resta agradecer à todas as vivências e lugares que passamos e confiar que o que é certo para nós se apresentará.

 Grande abraço,
Aline