“Vida e morte se penetram reciprocamente. Só podemos viver se sabemos da
presença da morte e com ela estamos em harmonia”. Bert Hellinger
Muitos
de nossos problemas têm a ver com os mortos do nosso sistema familiar. Eles nos
influenciam e talvez nós também os influenciamos. Quando algo em relação aos
mortos da nossa família ainda se encontra sem solução, isso acaba atuando de
modo perturbador no presente. Nesse sentido encontramo-nos presos ao passado,
ao invés de olharmos para o futuro.
Como
o luto em relação aos mortos tem mais êxito? Quando agradecemos os mesmos.
Quando olhamos para as coisas boas que deles recebemos e dizemos: “eu sou
grato, conservo o que você me deu e em sua memória farei algo de bom com isso”.
De repente os mortos podem libertar-se, pois aquilo que nos deram continua
atuando, isto é, realizaram o seu objetivo. O luto alcança seu objetivo quando
nos entregamos à dor e, através dela, respeitamos e honramos os mortos. Pelo
contrário, quem mantém o luto por muito tempo segura os mortos, embora eles
queiram ir.
Esta
é uma forma. Porém, muitos ainda estão zangados com os mortos, ressentem-se
deles. Muitos clientes que nos procuram ressentem-se de seus pais, embora
talvez já estejam mortos há muito tempo. Dessa forma os vivos continuam ligados
aos mortos e talvez os próprios mortos também não estejam em paz, pois nós os
seguramos através de nossas expectativas e exigências. Qual a solução aqui? É
dizer: “não importa o que tenha acontecido, foi precioso para mim”. Aquilo que
foi, independente do que foi, torna-se uma força a nosso favor à medida que
concordamos. Torna-se um peso apenas quando o rejeitamos.

Na
maioria das constelações trata-se, de uma forma ou de outra, da vida e da
morte. Dificilmente se encontra uma família onde a morte não tenha arrebatado
um membro mais cedo do que julgamos ser justo. Despedir-se dos mortos de um
modo digno e consciente é extremamente importante para a saúde de nossa alma.
Isso se percebe também pela energia e pelo esforço que se despendem na guerra
para abrigar e sepultar dignamente os mortos. Isso é compreensível pelo lado
dos vivos; mas que também os mortos necessitam que os vivos saibam de sua morte
e se despeçam deles é algo difícil de entender, pois nada sabemos sobre os
mortos.
Entretanto,
nas constelações eles são representados por pessoas vivas, elas não podem
representá-los em sua realidade, como mortos, mas podem representá-los em seus
efeitos sobre a alma dos vivos e os mortos, mesmo para além da morte. Pelo
comportamento muitas vezes surpreendente dos representantes dos mortos e pela
força que deles provém, em muitas constelações, podemos apenas pressentir que
aí atuam forças mais poderosas do que podemos imaginar com a nossa maneira
habitual de considerar os mortos.

No
decorrer dos anos, no trabalho com as constelações familiares tornou-se cada
vez mais claro que entre os sobreviventes e os mortos, bem como entre os
perpetradores e suas vítimas, se estabelece um vínculo profundo, que ultrapassa
os diretamente atingidos e se estende aos descendentes deles. Por exemplo,
soldados que voltaram da guerra sentem-se, de modo especial, ligados aos seus
companheiros mortos e também, da mesma forma, aos inimigos que mataram. Em
consequência, descendentes de soldados que sobreviveram voltam-se para os
companheiros e inimigos mortos de seus pais e avós, querem colocar-se ou
deitar-se ao seu lado e sentem um desejo, na aparência surpreendente, de morrer
ou também, às vezes, de matar-se. Eles estão apenas assumindo o desejo
inconsciente ou reprimido de seus pais e avós, de estar com seus camaradas e
inimigos mortos.
vida e morte
A
vida vem de longe e nós não sabemos onde é a sua nascente. Ela flui de longe
para nós. Ela vem da origem, nos toma, nos usa, nos toma a serviço e nos deixa
cair de volta à origem, seja ela qual for. A alma conhece a origem e a
procedência da vida. E ela tem uma ânsia de voltar à origem – depois de um
tempo. Assim como a vida nos captura, sentimo-nos carregados por ela e sabemos,
ao mesmo tempo, que ela está suspensa por um fio de seda. Esse fio se rompe
depois de algum tempo – e nós submergimos de volta à origem.
A
alma não tem medo desse movimento. O eu, às vezes tem medo. Quem está em
harmonia com esse movimento, comporta-se de acordo com aquilo que apoia a vida.
Pois a vida, quando nos captura, exige de nós também a aceitação desse
movimento. Assim, estamos tanto em harmonia com a vida como também com o fim,
quando chega a hora.
Na
alma existe uma atração em direção aos mortos e ao morrer. Esse é um movimento
muito suave e profundo. Todo movimento da vida é, pois, um movimento para lá de
onde ela emergiu. Às vezes, vem desse movimento, do ir com ele, algo como um
vento ascendente, como uma corrente térmica que eleva. Pois, alguns vão muito
cedo com esse movimento. Vão para a morte antes do tempo, e isso é ruim.
Existe
um tempo e uma ordem adequados para esse movimento à vida e, então, de volta à
origem. Existem alguns que renunciam à vida antes do tempo, quando o movimento
ainda não está realizado. Se, por exemplo, uma criança perde cedo um de seus
pais, então tem a ânsia de ir para o pai ou para a mãe ou, também, para um
irmão que morreu precocemente. Ela acha que se ceder a esse movimento os
reencontrará. Essa é uma ideia infantil. A solução seria reencontrar o caminho
de regresso ao grande contexto e deixar-se recapturar e carregar pela vida,
tanto quanto a vida queira e permita. Então, se está em harmonia.
A
morte é maior que a vida. O reino dos mortos é o maior reino e é aquilo que
permanece. A vida é algo transitório, algo que emerge e torna a submergir. O
grande é aquilo de onde emerge a vida, e onde ela mergulha e torna a submergir.
Quando morremos passamos a um outro estado do qual nada sabemos. Por isso, para
mim, a vida tampouco pode ser o máximo ou o maior. Aquilo de onde a vida emerge
tem de ser maior que a vida.
Trechos adaptados de Bert Hellinger em seu livro A Fonte não Precisa Perguntar pelo Caminho